Agiriam os felinos por vingança?
Segundo o dicionário, vingança é um misto de revolta, revanche, castigo, punição. Não existe este sentimento na percepção animal. Trata-se de algo próprio dos humanos. Ao contrário do que algumas pessoas pensam, gatos não sentem ciúmes, rancor, raiva, nem se vingam de seus tutores. Antes, agem por impulso, comportamento treinado, característica de sua raça, e, de traços de sua personalidade.
É um equívoco avaliar que gatos são egoístas, ciumentos, que fazem xixi no chão da sala por vingança ou birra. Não, eles não têm este nível de sentimento, seria humanizá-los, redirecionar nossos próprios sentimentos quando observamos seu comportamento em agir. É equipará-los às nossas atitudes.
O gato conhece a frustração – e o medo gera tal emoção. Quando não se sente confortável ou seguro para lidar com alguma questão, o gato se sente impotente, frustrado e mesmo incapaz. Se faz xixi na sala, muitas vezes está pedindo socorro por diferentes motivos, dentre eles, pode ser uma doença no trato urinário ou outro gato no lar que o ameace, o perturbe. Analise seu gato pela perspectiva dele, não humanize seus sentimentos, e, reações.
Existe um tipo de neura que você mesmo constrói, sem fundamento na medicina veterinária ou na psiquiatria felina. Dizer que gatos são sensíveis demais, e, por isso deve-se falar baixo, se esquivar de viajar, não mudar móveis de lugar em sua casa, não aborrecê-los, não tocar a campainha pra não assustá-los, que deveria lavar a caixa de areia com amônia quaternária para desinfetá-la, não deixá-lo subir na cama, que pegaria doenças se passear na rua de coleira, que teria que desinfetar suas mãos após pegar em seu bichano, dentre outras coisas. De onde surgiu isso? Se os gatos pudessem entender dariam boas risadas, e, lhes diriam para procurar um psicólogo que o ajudasse a se libertar dessas falsas crenças.
E, nesta reflexão, o que seria humanizar um pet, especificamente um gato?
Algumas pessoas consideram humanização, e, mesmo infantilização, vestir uma roupa no gato, seja um vestido, laço, bandana ou gravata. Se o objetivo for apenas tirar fotos, e, alcançar curtidas nas redes sociais, submetendo o bichano a uma sessão cansativa, e, exigindo que se comporte durante as fotos, inclusive brigando com ele por não olhar para câmera, teríamos que concordar.
Todavia, é possível colocar o adereço, por alguns minutos, num contexto de brincadeira usando penachos, bolinhas, algum objeto para distraí-lo, e transformar o ensaio numa grande brincadeira. E, sim, o humano fotógrafo precisa ser rápido na execução, e, ter criatividade para chamar a atenção do gato. Neste contexto é aceitável. Você coloca a roupa, e brinca com ele enquanto tira algumas fotos.
Outros consideram humanização tratar o gato como se filho fosse, pegá-los no colo. Sua intimidade com ele é importante, a troca de afeto, o carinho. Porém, gatos não são crianças de colo. Raríssimos da espécie gostam, e, os que toleram o fazem por minutos.
Normalmente, nós tutores somos carentes, e, queremos abraçá-los a todo tempo, nos excedemos em passar a mão neles, atitude identificada por ‘Felícia’ (quem não resiste a algo fofo e quer abraçar).
Controle-se. O gato gosta de carinho, Esteja certa de que quando o abraçamos é uma carência nossa, de humano. Por eles um carinho no dorso, um afago no queixo ou bochecha, uma cabeçadinha ou piscada são suficientes para uma comunicação positiva – mas reagem agressivamente se passamos a mão em sua barriga ou pata, por autodefesa – são locais que devem estar livres para uma possível fuga ou ataque (felino é caça e caçador ao mesmo tempo). Portanto, não acaricie tais locais. Outros se jogam no chão de barriga pra cima quando o tutor se aproxima, tamanha felicidade, e, gostam do carinho na barriga. Temos que descobrir o perfil do felino que temos em casa.
Portanto, se policie, e resista a pegá-lo no colo a todo momento. Escolha um horário no dia, e, por breves minutos. Uma boa estratégia é antes do sachê, quando estão solícitos às interações.
Em nosso lar, por exemplo, esta intimidade ocorre pela manhã, antes do sachê (não sou boba!). Eles esperam, ronronam e vibram com o momento porque associaram à comida predileta, que vem em seguida. Pego um a um no colo, converso, digo que os amo, amasso, beijo, faço carinho. No resto do dia procuro me controlar, às vezes funciona.
Observe se você tem assediado (insistência impertinente em se aproximar de alguém) seu companheiro. Tem gente que parece perseguir o bichano na casa como um paparazzi, seja para tirar fotos, seja para reclamar onde ele sobe, desconfiando aprontar. Seu gato precisa ser respeitado. Mesmo os gatos mais carentes precisam de espaço.
Outro ponto: deixe ele comer, caçar, brincar, passear, arranhar, explorar o mundo, e, dormir como um gato onde ele quiser – no tapete, no chão, na toca, pendurado, com a cabeça e pernas saindo do nicho… não o acorde porque você quer a atenção dele.
E se ele fizer algo que você desaprova? IGNORE-O. Você leu direito, se o seu gato fizer algo que você não gostou, ignore-o como se ali ele não estivesse. De nada resolve tentar lhe dizer que está errado, gritar, ou pior, puni-lo – spray não educa, bater é crime de maus tratos animal, e, dialogar é comportamento humano – o dialeto do animal é outro. Princípio da moderna psiquiatria felina.
Seu gato está mexendo num objeto decorativo e vai quebrá-lo? Não grite nem faça um alarme. Finja que ele não está ali, pegue o objeto e retire-o do lugar sem falar nada, e sem olhar em seus olhos. Aliás, objetos assim devem estar inacessíveis ao pet, e, coexistentes com brinquedos disponibilizados para distração do gato. Parece redundância, mas, ainda há casas em que o gato possui uma vasilha de água e outra de comida, sem brinquedos. Logo, ele procurará fazer de algo o seu passatempo como cortina, boneca de porcelana, enfeites e afins.
Às vezes olhamos para eles, e, não os compreendemos – mas não precisamos entendê-los em tudo, somos de outra espécie. Precisamos amá-los e respeitá-los como são. Que venha a nova geração de gateiros sem medo de fazer seus gatos felizes!
Um abraço,
Doralice Goes
Consultora do bê-a-bá felino e autora do perfil @miando123